quarta-feira, 4 de março de 2009

Nascer

Foto: Paula Lyn - www.paulalyn.com.br

O poeta tinha razão: só as mães são mais felizes. Ainda não sei qual pó mágico colocaram nesta relação que faz com que eu me encante com uma palavra errada. Adormeço ouvindo o mantra de sua voz fininha tentando dialogar ainda muitas vezes em língua desconhecida.

E me encanto com a pequena mão que me acaricia a noite só para saber se estou mesmo ali. Como posso chorar sozinha lembrando do seu pequeno corpo aninhado junto ao meu, nas longas noites que passei balançando você para lá e para cá, murmurando palavras de amor no seu pequeno ouvido. Eu não tinha pressa que você crescesse e pude saborear cada sobremesa oferecida com a calma de uma velha alma.
Os primeiros movimentos sozinhos, os passos segurando firme suas mãos e sustentando seu caminhar com o olhar mais admirado, sabendo que agora o sol incidia em seu céu e lhe unia a Deus.

E o meu néctar, minha alma que lhe ofereço sem pressa que você parta, com a doçura de uma fêmea que certa está da melhor caça. Vejo você saltar, correr, sorrir e brincar como um pequeno mamífero que dia a dia começa a escrever sua história com suas próprias palavras.
Eu me descubro poeta de seus poros, bailarina de seus ruídos. Você é uma linda obra de arte que inspirei-me em um inverno para te trazer no meu verão.

Assim como as flores que chegam na data de tua vinda, sempre saberei que estás lá, crescendo como um pássaro encantado cada vez que a frondosa Acassia despejar suas flores amarelas, me lembrando que o inevitável tempo de nascer desembarca todos os anos, no mesmo dia.

Ladrões de Palavras

Foto: Kalu Brum - autoretrato

Roubaram-me as palavras. Minhas frases parecem perdidas na minha busca por aquilo que não sei se quero seguir.

Sinto falta daquela poesia borbulhante que nascia das entranhas e não mais pertencia a mim. Aquele entusiasmo cheio de vida, dos pulos de menina bailante que hoje são passos pesarosos de uma mulher que tem que ganhar a vida.

E nas portas fechadas, sinto voltar a minha claustrofobia e a imensa vontade de habitar o teto de estrelas e o chão de terra que construí o castelo de minhas idiossincrasias. Enquanto tento sorrir, não escondo a tristeza do canto de olho, nem as sombras que se formam no sol por trás de mim.

Roubaram-me as palavras e elas voam como passáros livres esperando o semear do meu jardim. Enquanto espero com calma, balançando para frente e para trás no relógio da vida, descubro a certeza de que só agora tem sentido.

Olho parte de mim crescer aqui fora, vejo parte de mim renascer dentro, chamando a artista e a poeta para sambar a noite inteira, enquanto adormeço dando peito.