quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Poeira ao vento


Passos apressados pela floresta escura. Era noite e os pés descalços exibiam feridas da caminhada íngreme para dentro mim mesma. O sangue carmim molhava a terra e em cada passada flores espinhentas e cheirosas traçavam o labirinto.

Recordo os momentos em que apenas desabei de cara no chão, com a boca próxima do solo a sugar a seiva da terra que me faltava. Não sei quantas vezes procurei por mãos estendidas e encontrei força de não sei onde para continuar a jornada fria, em que as gotas de chuva e suor me abriam pétala por pétala. Em nenhum outro momento me senti tão desprotegida e unida ao todo, nas sombras e luzes.


No meu castelo interno quebrei todas as paredes. Estava cansada dos pilares antigos e mofados que sustentavam a insustentabilidade da eterna mutação. Construí meu palácio com ladrilhos de terra, teto de estrelas e paredes de vento. Minha casa agora muda com as estações, é fria, seca e brilhante como o inverno, despenca como as folhas de outono, resplandece no verão e floresce na primavera.

A chuva fora tão forte que me deixou munida apenas de espinhos, que pensava serem mais fortes que garras de tigres e descobri que apenas espetam rasos sentimentos. Mas sangram por dentro, sangram para fora. E o carminal pigmento dá novo sentido a vida. A jornada está ao fim. Pelo menos esta trilha, pelo menos neste labirinto. Sim, ainda quero dividir o mesmo barco e lanço os remos ao leões. Por enquanto continuo a seguir esta viagem controlando as marés, os ventos e as brumas, abrindo portais na jornada.

Eu serei sempre aquela que dança com aquilo que não se pode ver e sentir. Mas, entro na galeria antiga e escolho uma roupa colorida para brincar de viver por aqui, até que chegue a hora da minha partida. No final desta escalada, meus pés e mãos se nutrem da certeza da paisagem que avistarei lá de cima. Apesar da dor, apesar do cansaço, estou lá, inteiramente aos cacos. Fragmentos que misturam velhos e novos padrões lançados no tubo que se move e nunca se repete do caleidoscópio divinal.

Posso ver minha jornada e as flores que cultivei nos meus passos. De cima festejo a coragem de ter mudado a rota e traçado um novo labirinto, mais profundo e escuro, que me deu asas para eu chegar e voar como as areias do vento que escapam da mão do menino.

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