quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Eu me traduzo nas entrelinhas

"Um homem jamais pode entender o tipo de solidão que uma mulher experimenta. Um homem se deita sobre o útero da mulher apenas para se fortalecer, ele se nutre desta fusão, se ergue e vai ao mundo, a seu trabalho, a sua batalha, sua arte. Ele não é solitário. Ele é ocupado. A memória de nadar no líquido aminótico lhe dá energia, completude.

A mulher pode ser ocupada também, mas ela se sente vazia. Sensualidade para ela não é apenas uma onda de prazer em que ela se banhou, uma carga elétrica de prazer no contato com outra. Quando o homem se deita sobre o útero dela, ela é preenchida, cada ato de amor, ter o homem dentro dela, um ato de nascer e renascer, carregar uma criança e carregar um homem.

Toda vez que o homem deita em seu útero se renova no desejo de agir, de ser. Mas para uma mulher, o climax não é o nascimento, mas o momento em que o homem descansa dentro dela". Anais Nin

terça-feira, 24 de agosto de 2010

Embotada de Mim

Foto: Paula Lyn
Houve um tempo que eu temia a escuridão. Aprisionava a louca nos palácios obscuros de mim. Ela cantava, nua, canções de cabaré. Vestido vermelho, flor no cabelo, bailava no vento da fresta dos meus pensamentos. Eu sentia medo de sua vida pulsante, da carne flamejante de um recém nascido quente em um mundo gelado.

Ela é a luz, a escuridão, a polaridade sem controle, a mudança sem aviso. Ela pulsa no meu ventre e chora por não ser ouvida. Ela sou eu. Ela é a parte mais louca de mim. Ela é a atriz, a puta, a artista, aquele modo de ver a vida com cores demasiadamente embotada de tinta.

Abri os palácios da minha mente e a libertei. Ela me fez chorar mostrando por quanto tempo a escondi para ser uma faceta de mim. Ela me abraçou, beijou minha boca profundamente e mordeu a minha língua. Me fez sangrar, tingiu a minha vida de carmim. Eu me perdi para me encontrar.

Como é bom ser eu, irremediavelmente eu. Com minhas luzes e sombras, com meus descontroles, com minha maneira de viver. Com ela aprendi a cantar para ser ouvida e quando tudo falhar, mostrar os seios e girar na sala vazia.

Com ela aprendi a defender o meu tempo, o meu eu, o meu ela, meu elo com uni-verso, meus nós, meus laços com o acaso. Eu tranquei a mãe que escolheu a hora da minha estréia, sem soar os três gongos. Amarrei suas mãos para que não mais me puxe os pés, com as mãos frias. Ela trancada, me liberto.

Danço comigo, fazemos amor com o tempo e mergulhamos no sentimento. Somos inteira: eu e ela. Eu. Estou plena de ser embotada de mim. 

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Poeira ao vento


Passos apressados pela floresta escura. Era noite e os pés descalços exibiam feridas da caminhada íngreme para dentro mim mesma. O sangue carmim molhava a terra e em cada passada flores espinhentas e cheirosas traçavam o labirinto.

Recordo os momentos em que apenas desabei de cara no chão, com a boca próxima do solo a sugar a seiva da terra que me faltava. Não sei quantas vezes procurei por mãos estendidas e encontrei força de não sei onde para continuar a jornada fria, em que as gotas de chuva e suor me abriam pétala por pétala. Em nenhum outro momento me senti tão desprotegida e unida ao todo, nas sombras e luzes.


No meu castelo interno quebrei todas as paredes. Estava cansada dos pilares antigos e mofados que sustentavam a insustentabilidade da eterna mutação. Construí meu palácio com ladrilhos de terra, teto de estrelas e paredes de vento. Minha casa agora muda com as estações, é fria, seca e brilhante como o inverno, despenca como as folhas de outono, resplandece no verão e floresce na primavera.

A chuva fora tão forte que me deixou munida apenas de espinhos, que pensava serem mais fortes que garras de tigres e descobri que apenas espetam rasos sentimentos. Mas sangram por dentro, sangram para fora. E o carminal pigmento dá novo sentido a vida. A jornada está ao fim. Pelo menos esta trilha, pelo menos neste labirinto. Sim, ainda quero dividir o mesmo barco e lanço os remos ao leões. Por enquanto continuo a seguir esta viagem controlando as marés, os ventos e as brumas, abrindo portais na jornada.

Eu serei sempre aquela que dança com aquilo que não se pode ver e sentir. Mas, entro na galeria antiga e escolho uma roupa colorida para brincar de viver por aqui, até que chegue a hora da minha partida. No final desta escalada, meus pés e mãos se nutrem da certeza da paisagem que avistarei lá de cima. Apesar da dor, apesar do cansaço, estou lá, inteiramente aos cacos. Fragmentos que misturam velhos e novos padrões lançados no tubo que se move e nunca se repete do caleidoscópio divinal.

Posso ver minha jornada e as flores que cultivei nos meus passos. De cima festejo a coragem de ter mudado a rota e traçado um novo labirinto, mais profundo e escuro, que me deu asas para eu chegar e voar como as areias do vento que escapam da mão do menino.

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Nascer ao contrário

Nascer é morrer ao contrário. Em nosso drama humano descobrimos mil possibilidades para que possamos ser ainda mais. Quantas vezes não temos que nos encolher com tanta força para saltar para trás do muro alto que surge a nossa frente.

E naquela contração nos falta ar, nos falta coragem, nos falta até mesmo a lembrança de para onde estávamos indo. Naquele encolhimento que antecede o pulo estamos diante da morte. É frio, escuro, vazio, desesperador. E a gente se pergunta: e aquela luz toda que senti? E a vida que é um reflexo da quase morte, porque agora me faz sentir o meu lado mais obscuro.

A vida dos corajosos é repleta de mortes, repleta de momentos angustiantes para emergir uma nova instância de nós. É da dor que fazemos nascer a luz, como o foi da primeira vez no universo.

É do verbo que se fez todas as coisas. E este verbo a gente nunca se esquece. Pois ele está lá, gritado com a batida do nosso coração, dos ruídos tremeluznetes do sangue que são como folhas que atingem um corpo que corre nu numa floresta escura em alta velocidade. O corpo se dilacera, mas ao chegar diante da paisagem encantada de cachoeiras e flores, sabemos que valeu a pena.

E neste nascimento vejo nascer alguém mais humana, que aposentou a fantasia de heroína, vestiu as roupas humanas e descobriu que a verdadeira salvação é de nossa parte mais preciosa. É muita coragem  mergulhar tão fundo. E como no parto se lembre, quando doer demais, você já está lá diante da vida.

terça-feira, 15 de junho de 2010

Denaneios

E de tão apertada começo a sentir a energia se dissipar. Célula por célula se desagrega fazendo ventar minha alma, que balança de lá para cá e se desintegra. A névoa fria percorre meu ser, domina cada núcleo celular implodindo as pontes de hidrogênio. Sinto o frio do corpo sem limite, do feto sem colo entregue ao berço gélido. Encolho-me toda tentando reintegrar alguma coisa que não tenha se partido nos mil cacos lançados para o universo.

Busco em algum lugar uma voz, uma luz, um afago por entre os cabelos escurecidos. Sinto tremer a solidão soterrada que me fazia criar mil jogos para me sentir nas alturas, nos palcos mais luminosos. Olho a purulenta ferida que sangra um líquido negro e fétido. Sinto nojo, sinto medo de ser também aquela escuridão viscosa. Caminho pisando em um chão que segura meus pés e me suga para dentro. Eu tento segurar em um pequeno ramo verde, com toda a força do meu ser. Nada vejo senão um oceano escuro, lamacento em uma noite de lua nova.

Quando não me resta forças de vida, abraço tânatos. Sinto que a noite fria me engole e me beija com dentes pontudos que me dilaceram. Eu não sinto mais dor. Eu não sinto mais nada que tenha nome ou que possa suportar combinações de letras. Deito em uma superfície macia de células quentes. Tudo pulsa em uma batida de vida. Sinto calor dos meus pés, um abraço carinhoso. A luz volta em melodia. Eu escuto o chamado e agora posso voltar para meu ninho. Me enrolo como uma samambaia e em espiralantes passos volto para casa. Lá está o bebê no berço debaixo de uma janela aberta, de um ensolarado dia de julho. Fecho a janela. Visto a menina com a roupa da minha carne. Ela lança os braços para o ar como quem clama sem palavra por meu colo e me olha fundo nos olhos. Negros olhos vividos. O choro cessa. Dou-lhe o seio e acaricio sua face transfigurada pelo medo e solidão. Vejo surgir um breve sorriso de quem redescobre seu lugar e agora pode brincar de viver.

Olho tão de perto estes olhos que mergulho para dentro deles. Agora somos um novamente. Caminho repleta de vida, redonda como a lua cheia abrigando uma nova instancia de mim, sabendo que haverá novamente o momento do parto em que poderei abraçá-la com a força das entranhas, dar-lhe meus seios fartos de ternura, embalá-la nas melodias de luz e ver crescer nos campos floridos um menina de asas nos pés.

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Grata

Eu agradeço a ti, por segurar na minha máo, neste escura floresta e me levar novamente para o ventre da Mãe.

Eu agradeço a mãe por errar tentando acertar e me amar da maneira que pode, mostrando que nunca é tarde para o reencontro.

Eu agradeço ao Pai, por me entregar o vestido vermelho e me autorizar, mil e uma vezes que eu pudesse entrar no baile da vida, sabendo que ao fim, mais uma vez, você estaria lá para me buscar e me levar para casa.

Eu agradeço ao filho, por fazer renascer em mim uma parte esquecida que o impossível fez surgir.

Eu agradeço ao companheiro por me amar desta maneira tão intensa, por suportar meus encolhimentos.

Eu agradeço a Mãe da Mãe por em sua loucura se redimir no amor que vence distâncias, demências e cura na certeza de que a vida ganha um novo sentido quando se é amado.

Eu agradeço a irmã por seguir caminhos diferentes e mesmo assim ser feita um pouco de mim.

Eu agradeço a mim, por esta coragem de me reinventar tantas vezes para fazer nascer uma nova vida em cada etapa.

Eu agradeço por viver e não apenas sobreviver. E assim me liberto para a possibilidade de alcançar aquilo que busco, nos labirintos de mim.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

Orgasmo

Um corpo com cheiro de maresia toca a minha alma. Ele voltou para dentro de mim em movimentos oceânicos. Mal completo o orgasmo e ele já se foi novamente. Acordo assustada. Por que ele volta para meus sonhos? Por que me abandonou novamente?

Levanto da cama quente e sinto o corpo arrepiado pelo frio do inverno da minha alma. Meu coração acelera, as pontas dos meus pés congelam. Não quero mais sentir esta solidão e este gélido vento que volta e meia bate na minha porta e se instaura dentro de mim. Eu quem amo os céus e os mares com mil sóis brilhantes não consigo me entender em frentes frias sem movimento.

Deito na cama, embolo um cobertor. Penso na minha mãe. Sim, ali o ciclo de confiança se desfez. Eu quem fui nascida e abandonada em um berçário frio, cujos os braços maternais que me acolheram foram de minha avó. Os seios que mataram minha fome eram de plástico. Eu, quem nem sabia pedir, que nem sabia que meu corpo se estatelaria no chão ao me entregar, fui traída.

Tive que abraçar aquela que me amarrava, que fazia um jogo doentio de uma mente cheia de fantasmas. E ali eu aprendi sobre o amor.

Embora a confiança tenha sido novamente quebrada quando um novo ser cresceu no ventre daquela que havia sido, como eu, abandonada por sua mãe. O feto não vingou, mas a dor floresceu. Agora, aos 10 anos de idade estava nua, sozinha na floresta escura. Perdida, sem saber para onde ir.

Penso na minha irmã e seu pequeno feto. Sinto medo. Lembro da menina de dez. Medo que ela me roube novamente, que a história se repita. Ela quem chegou quando quatro meses tinha e tomou o colo, os seios de minha mãe para si e de lá nunca saiu. Ela que parece ser o reflexo da irmã que me pariu.

Eu me sinto vingada no amor sem limites daquela que não pode me acolher e agora tenta se recuperar na extensão da minha carne.

Nos olhos do meu pequeno me vejo espelhada. Aquela menina doce que via luzes e fantasmas. Aquela com medo do escuro, do silêncio profundo das vozes que nunca se calam. E em minhas escolhas eu me sinto curada, nos seios que ofereço, na presença, no carinho, no acolhimento. Como se eu mesma pudesse me abraçar e dizer: tudo bem, mamãe está aqui.

E nas cantigas que entoou até ele adormecer, canto para meu bebê dormir aqui dentro. Sem medo porque agora eu estou ali, sendo aquilo que mais me faltou para a melhor parte de mim.

Mas não posso negar que sinto medo de perder novamente aquela que agora segurou nas minhas mãos e que posso niná-la como ela mesma não soube fazer comigo. Aquela que faz diferente, com amor igual, com menos fantasmas com meu menino.

Eu sinto medo, um medo infantil do abandono. Quero fugir para bem longe, onde uma terra possa me aquecer e me apertar com tanta força que eu pare de respirar com meus pulmões. Que eu possa me encolher tão apertada que minha células desapareçam até que eu seja novamente um orgasmo infinito.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Manto de Luz

Foto: Kalu Brum
Acordei
Estiquei minhas asas
Vesti meu manto
Teci da liberdade da luz

Voeei para dentro de mim
Aquecida pela malha cintilante
Olhei ao meu redor
E avistei flores de lótus
Beijadas por pássaros luminosos
Que desenhavam em todo planeta
Uma brilhante teia da vida

Seguindo os fios perolados
Saí do labirinto de Sansara
Me encontrei na Ley da Liberdade
Para esticar minhas asas
E voar para além de Maya
Seguindo os rastros brilhantes
fazendo-me cometa e estrela
Me tornando para hoje e sempre
Um anjo Índigo da Luz

terça-feira, 11 de maio de 2010

A mãe que cura


Aquilo que eu outrora via perfeito, entendi ser medo. Sempre sozinha. Ironia, porque o sentimento mais dolorido dentro de mim se chama solidão. Eu sempre me senti sozinha.Sempre. De alguma forma, por alguma razão que desconheço, não confio em ninguém para me entregar completamente.

Me dei conta que sou autosuficiente no prazer. Atinjo mil e um orgasmos mas nunca em contato com o outro, apenas utilizando o outro como objeto para atingir o prazer. Mas nunca me entrego por completo. Como se tivesse um medo agudo de ser atingida, ferida.

Tenho pessoas que amo muito e eu amo todas elas. Mas sempre que preciso de colo, eu não sei pedir, eu não sei receber, eu não sei me entregar. Quantas vezes não ouvi a frase: não sei o que te dizer, vocë é tão poderosa. E este poder de ação tem um contraponto de uma mulher frágil, extremamente frágil que não se permite chegar, que não consegue se entregar. Parece que cuido melhor de mim quando cuido do outro. E quando chega a hora de fazer algo por mim sinto que só eu mesma posso fazer.

Assim é no sexo, nas amizades, no meu parto. Eu pari sozinha. Não por escolha, mas por medo. Enfim era minha mulher selvagem naquele momento agindo como as mamíferas – solitárias e plenas, com medo do predador.

Preciso ser acolhida, preciso acolher o bebê que foi parido, segurou a toalha, não mamou e ficou horas sozinho no berçário. O bebê que ainda mora dentro de mim, que se encolhe na madrugada escura com medo de fantasmas e não sabe quem pode salvá-lo.

O parto pode ser um momento mágico. Parimos tantas memórias, de tantas vidas. Parimos o parto de nossas mães, avós, dos nossos ancestrais. Parimos o bebê que fomos. Se a infância é a fase mais importante das nossas vidas, o primeiro ano é fundamental. E o nascimento primordial.

Eu sei que fui nascida, pelo menos, no dia certo. Mas nasci com falta de mãe. Dos olhos da minha mãe, do calor do seu corpo, do seu abraço. Perdemos nosso vinculo inicial, nossa ligação. Eu quero e preciso recuperar.

Por isso olhei nos olhos e não me separei do meu filho por um segundo. Por isso nunca deixei que ele chorasse, por isso sempre atendi a suas demandas. Ele mama no peito porque não precisa correr para crescer para calar sua dor profunda de solidão infantil. Ele é grande sendo pequeno. Amado com a completude de minha alma.

Eu tinha um ursinho de quem me libertei apenas com 21 anos depois da terapia . Um urso que meu pai me deu e que segurava tão forte, em posição fetal, porque só assim me sentia segura, confortada. Mas,por vezes, quando a solidão bate, quando me sinto perdida como um bebê longe de sua mãe, sem ninguém para acolhe-lo em seu choro visceral, embolo um pano e abraço.

Me sinto feliz porque meu filho nunca teve um bicho como intermediário de seus sentimentos. E assim, na figura do meu filho, eu me curo, acolho o bebê quem fui. Em sua figura alegre, bebo a alegria que me foi negada, no peito cheio de leite, supro minha carência e assim apaziguo minha criança interior que agora pode crescer em paz, refletida na figura de um menino feliz.

Foto: Paula Lyn

quarta-feira, 5 de maio de 2010

A dor e o sofrimento


Um dia minha irmã me disse: você sofre porque você pensa demais. Ela tem razão, mas como uma admiradora dos tibetanos eu digo: sigo os rastros da minha dor.

Não calo a dor de parto, apenas me abro. Não cego uma dor de cabeça, apenas relaxo. A dor é inevitável. O sofrimento é opcional. Rubem Alves diz que ostra feliz não faz pérola.

É isso, na hora de fazer a pérola, deixo doer para secretar o fio de madreperóla e teço algo que será uma jóia valiosa para mim.

Assim foi naquele suicídio que transformou minha vida. Se não fosse a morte, nunca pensaria sobre a vida. Se não fosse meu parto, não conheceria a dor de mim tão de perto.

E nas dores eu renasço com uma felicidade cheia de gratidão e conectada, não ao mar de livros e pensamentos, mas vivendo na carne aquilo que minha alma precisa para engrandecer-se.

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Todo mundo

O medo é um inimigo cruel. A gente aceita qualquer coisa para sentir-se seguro. Assim se faz a guerra
cria-se o medo do inimigo e a possibilidade de atacá-lo antes de ser antingido.

Ser diferente é se confrontar com a pergunta? Por que vocë quer ser diferente?

Todo mundo faz cesárea
Todo mundo dá mamadeira
Todo mundo dá chupeta
Todo mundo toma remédio
Todo mundo toma vacina
Todo mundo assiste TV
Todo mundo acredita que palavra de médico é lei
Todo mundo tem medo de viver
Todo mundo acha que pode viver sem Deus
Todo mundo acha que dinheiro é mais importante que espiritualidade
Todo mundo busca uma felicidade externa
Todo mundo treina os filhos para serem os melhores
Todo mundo sobrevive

Eu aprendi que só faz sentido VIVER. Eu caminhei muito para saber que todo mundo está dormindo. Quem é você para achar que está certa?!, grita todo mundo. Eu só saio bailando sem me esconder sendo considerada como louca por aqueles que não podem ouvir a Música.

quarta-feira, 10 de março de 2010

Tempo

O que é o tempo senão uma mera invenção humana para justificar a sucessão de acontecimentos? O tempo se mede pelos sorrisos, choros, ventos no cabelos, dores e pérolas que tecemos. Não importa se plantamos ou não uma árvore, se o livro nunca saiu da cabeça e o filho não foi gerado no ventre. O tempo vale por nossa capacidade de entregar-se a cada momento, com o conhecimento que só a maturidade vai nos dar e que o poeta cantou há tempos: o tempo não pára. Viver é agora, neste instante. É aprender com as mediocridades, rir dos egos inflados que explodem nos espinhos do tempo.


Se a gente corre atrás dele, tentando ser um pouco de cada coisa que o mundo e nós mesmos implantamos, nunca teremos tempo. Estaremos sempre atrasados, fora de lugar, procurando estar onde não se está. Falar de tempo é falar de escolhas. Caminhos que só fazem sentido no tempo presente porque nada mais existe. Não existe o filho que não teve, a árvore que não se plantou, o amor que se foi. Não faz sentido pelas leis da física chorar a partida de alguém porque esta pessoa continua vivendo dentro do tempo que cada pessoa tornou-a essencial.

E se eu ganhar uma bacia de jabuticabas, paro tudo e saboreio uma a uma, começando pela mais graúda de casca fina, que vai explodir e derramar seu néctar na minha boca. Outro dia Miguel chegou e me pediu: vem ver as nuvens comigo? Deitamos na grama, às 5hrs de uma tarde eterna, de mãos dadas. Se eu morrer com a bacia no colo, não importa. Estarei também saboreando com cada parte do meu corpo e alma aquela graúda e doce fruta que os homens chamaram de morte.

segunda-feira, 8 de março de 2010

Hoje é o dia de lembrar que todo dia é nosso

Somos mulheres: sentimos as ondas hormonais que passamos durante nossos períodos. O ápice da fertilidade, o acolhimento da menstruação. E na gestação o corpo a se transformar em cada fase. O parto que traz a dor prazerosa, a ardência apaixonante. Ser mulher, feminina e lunar.


Está na hora de abraçar novamente esta força que faz o mundo mais colorido, de reconstruir o novo feminino, sem as armadilhas do feminismo. Chegou a pílula, a falsa liberdade sexual. A menstruação passou a ser um empecilho para os objetivos. O corpo foi privado de seu pleno funcionamento. Sem conhecer seu corpo, a mulher valorizou o homem que é capaz de lhe dar prazer sem saber que o prazer é reflexivo: você mesma tem a capacidade de senti-lo. A mulher deixou de ver-se como parte da natureza, sendo ela mesma a deusa. Abraçou um Deus patriarcal que a oprime.

Quantas vezes não nos sentimos perdidas, com nossos corpos e nossa função no mundo? Nasceu a síndrome do pânico. A alma que chora. A mulher desacreditou em si. O “doutô” faz seu parto sem dor. Ela nasce confusa como mãe. Amamenta por pouco tempo, quando amamenta, para que os filhos aprendam a ser desde cedo auto-suficientes. Os bebês se consolam sozinhos, na enorme cama escura. As mulheres comemoram os filhos, que desde de cedo dormem sem colo, comem sozinhos, andam tão rápido. Talvez para fugir? Quem sabe?

De nós foi tirado o direito de parir da maneira mais orgânica: de cócoras. Foi lá no iluminismo francês quando a Rainha Vitória foi deitada para que o rei assistisse a seu parto. Logo depois as mulheres começaram a precisar de anestésicos e os irmãos de sobrenome fórceps fizeram história com seu aparelho de extrair bebês.

Deitamos com as entranhas limpas, os pelos raspados para que um homem fizesse nosso parto de maneira mais higiênica e visível. Para facilitar a saída do bebê fomos mutiladas em nosso órgão mais sensível. Perdemos a conexão com a Terra, com sua gravidade e a força dos nossos pés plantados no chão. Desconectamos com Deus quando nossas cabeças se deitaram em uma postura de passividade. Historicamente perdemos o sagrado direiro de parir.

E as feministas nas ruas na década de 60, pregaram a nossa liberdade sexual e direitos iguais que nos fizeram iguais aos homens em seus defeitos. Fomos para o mercado de trabalho e com a pílula perdemos a conexão com nossos ciclos naturais e toda a intuição que nos dava poderes especiais. Nossos filhos foram para escolas e começamos a padecer do mal da TPM, da menopausa precoce, da vida desconectada da grande mãe Gaia.

Nós mulheres, as grandes responsáveis pela mudança de cultura, ensinamos nossos filhos a serem precocemente independentes. Não fomos abraçados pelas entranhas de nossas mães, não vencemos nossa primeira batalha e fomos separados do colo materno em nosso primeiro choro solitário e frio, calado às vezes por um bico artificial.

Nosso peito e presença foram trocados por similares de borracha e silicone, gerando mais lixo para nossa mãe Terra. O perfeito alimento de nossas mamas, abandonado por um pó artificial de outro animal, enriquecido com mil vitaminas e desprovido de amor.

Os panos que prendíamos nossos filhos junto do corpo trocados por carrinhos que viram o olhar da criança para longe de suas mães, o universo mais lindo que precisam olhar. E as histórias contadas por aquela melodiosa voz conhecida trocada por um aparelho que coloca imagens prontas e histórias com vozes esganiçadas e frenéticas. Trocamos nossas presenças por presentes.

Aquela deliciosa comida substituída por papas processadas e esquentadas em um aparelho que gera ondas altamente maléficas. Nossos filhos não conhecem vacas, galinhas, macacos, que não sejam em zoológico ou documentários e poucos sabem os nomes das frutas naturais e que não nascem em caixinhas.

O que proponho hoje é resgatar este feminismo oprimido, a consciência de nossa responsabilidade enquanto mães de estar presentes, de participar da educação e oferecer um desenvolvimento mais natural e harmônico. Resgatamos a união com Terra e Céus na hora do parto, a ecologia da dança sagrada dos hormônios sem intervir com forças externas, de permitir que nossos filhos não fiquem com a lacuna do não acalanto de seu primeiro choro e não sofram as terríveis invasões de seus corpos pequenos e indefesos.

Somos loucas questionadoras em um mundo de gente que segue a corrente mecanicista. Resgatamos nosso adjetivo mais belo: mamíferas!

Somos bruxas, malucas que parimos em casa e dizem que fazemos ritual para comer placenta. Somos lindas com nossos corpos e peitos, sempre amostra. Fazemos a verdadeira revolução feminista. Plantamos a cooperação e o amor. Lá para frente, talvez em outra dimensão ou lugar, poderemos ver surgir os frutos da paz.

A estas mulheres, que se lembrem que hoje é o dia de lembrar que todo dia é nosso.

quinta-feira, 4 de março de 2010

Almas Companheiras

O relacionamento entre homens e mulher foi feito para dar errado. Em relação aos nossos pais passamos parte da vida adorando-os, outra destruindo parte deles de dentro de nós para construirmos nossa própria personalidade e um tempo de resgate. Com nossos filhos vivemos o processo inverso. Com amigos, ficamos no mesmo vagão enquanto a vida caminha para o mesmo destino depois alguns permanecem, outros se vão.

Mas com uma alma companheira é tudo muito intenso: por haver desejo há muita expectativa. Por haver expectativa há decepção e a constante decepção deixa o coração com uma casca. A gente passa a não sofrer mais com as brigas, mas não sente mais no coração aquela pulsação que nos fazia lembrar que estamos vivos.


E sempre alguém de fora vem nos mostrar o muro que construirmos. Destruir o muro só se faz com conversa, as vezes impulsionada por um surto. Um anjo de fora nos mostra que o coração ainda bate, nos lembra da pulsação da vida e a gente redescobre aquele outro do nosso lado, que a tanto nos ensina, com a dor, decepção e amor.

É um ciclo que se fecha dentro da relação, para seguir para uma nova fase, talvez sem tanta expectativa, talvez sem a mesma pulsação neurótica, mas sempre com amor. Eu fico feliz por ter chegado em mais um vale, por ter chegado no topo da montanha e desejado subir uma ainda mais alta.

Viver é transcender-se. E isso dó muito, mas é a única possibilidade de fazer de nossas asas aptas para o vôo.