quinta-feira, 10 de junho de 2010

Orgasmo

Um corpo com cheiro de maresia toca a minha alma. Ele voltou para dentro de mim em movimentos oceânicos. Mal completo o orgasmo e ele já se foi novamente. Acordo assustada. Por que ele volta para meus sonhos? Por que me abandonou novamente?

Levanto da cama quente e sinto o corpo arrepiado pelo frio do inverno da minha alma. Meu coração acelera, as pontas dos meus pés congelam. Não quero mais sentir esta solidão e este gélido vento que volta e meia bate na minha porta e se instaura dentro de mim. Eu quem amo os céus e os mares com mil sóis brilhantes não consigo me entender em frentes frias sem movimento.

Deito na cama, embolo um cobertor. Penso na minha mãe. Sim, ali o ciclo de confiança se desfez. Eu quem fui nascida e abandonada em um berçário frio, cujos os braços maternais que me acolheram foram de minha avó. Os seios que mataram minha fome eram de plástico. Eu, quem nem sabia pedir, que nem sabia que meu corpo se estatelaria no chão ao me entregar, fui traída.

Tive que abraçar aquela que me amarrava, que fazia um jogo doentio de uma mente cheia de fantasmas. E ali eu aprendi sobre o amor.

Embora a confiança tenha sido novamente quebrada quando um novo ser cresceu no ventre daquela que havia sido, como eu, abandonada por sua mãe. O feto não vingou, mas a dor floresceu. Agora, aos 10 anos de idade estava nua, sozinha na floresta escura. Perdida, sem saber para onde ir.

Penso na minha irmã e seu pequeno feto. Sinto medo. Lembro da menina de dez. Medo que ela me roube novamente, que a história se repita. Ela quem chegou quando quatro meses tinha e tomou o colo, os seios de minha mãe para si e de lá nunca saiu. Ela que parece ser o reflexo da irmã que me pariu.

Eu me sinto vingada no amor sem limites daquela que não pode me acolher e agora tenta se recuperar na extensão da minha carne.

Nos olhos do meu pequeno me vejo espelhada. Aquela menina doce que via luzes e fantasmas. Aquela com medo do escuro, do silêncio profundo das vozes que nunca se calam. E em minhas escolhas eu me sinto curada, nos seios que ofereço, na presença, no carinho, no acolhimento. Como se eu mesma pudesse me abraçar e dizer: tudo bem, mamãe está aqui.

E nas cantigas que entoou até ele adormecer, canto para meu bebê dormir aqui dentro. Sem medo porque agora eu estou ali, sendo aquilo que mais me faltou para a melhor parte de mim.

Mas não posso negar que sinto medo de perder novamente aquela que agora segurou nas minhas mãos e que posso niná-la como ela mesma não soube fazer comigo. Aquela que faz diferente, com amor igual, com menos fantasmas com meu menino.

Eu sinto medo, um medo infantil do abandono. Quero fugir para bem longe, onde uma terra possa me aquecer e me apertar com tanta força que eu pare de respirar com meus pulmões. Que eu possa me encolher tão apertada que minha células desapareçam até que eu seja novamente um orgasmo infinito.

2 comentários:

Anônimo disse...

Nossa Kalu, emocionante esse texto...profundo...complexo...

"Sem medo porque agora eu estou ali, sendo aquilo que mais me faltou para a melhor parte de mim."

Lindo demais, tocou meu coração...

Mil bjos com carinho infinito,
Elo da Betina

Kalu disse...

Obrigada Elo!